Amanda Pina Ferreira
Foto: Divulgação
Falamos muito de política de saúde, segurança, educação, mas nem imaginamos o quanto é importante a política pública voltada ao planejamento urbano. Nesse contexto, o zoneamento tem um impacto direto na vida de cada cidadão. Você deve estar pensando que para se preocupar com isso você tem de ser arquiteto ou engenheiro. Mas não. Eu mesma sou economista e meu enfoque aqui é associado à abordagem econômica desse tema. A restrição à oferta de moradia no curto e médio prazo acarreta no aumento do preço dos imóveis, o que impacta diretamente na qualidade de vida de todos nós e em todo ciclo da economia.
Nos últimos 12 anos no Brasil, o índice IGMI-R (Índice Geral do Mercado Imobiliário Residente), que mede a taxa média de valorização de imóveis residenciais, teve uma valorização anual de mais ou menos 12% ao ano enquanto a média do PIB durante os últimos 10 anos foi de 0,3% a.a. E o crescimento da renda no país de 2% a.a. durante o mesmo período. Uma coisa é certa: de nada adianta o preço dos imóveis crescer se a renda não cresce. Uma hora a conta chega.
E o que pode ter provocado um crescimento acelerado no preço dos imóveis? Parte da responsabilidade é da facilitação e abertura do crédito imobiliário no país. Entretanto, vários especialistas como Raul da Mota Silva Neto, professor da Universidade Federal de Pernambuco, e Fernando Ferreira, professor da Universidade de Wharton nos Estados Unidos, grandes estudiosos do Mercado de Habitação no Brasil, argumentam que o grande vilão é o Plano Diretor e zoneamento de muitas cidades no país, que são bastante restritivos. Isso porque a oferta de imóveis (com as leis e burocracias das prefeituras para aprovação de projetos) é mais lenta do que a demanda por imóveis. Ou seja, a demanda aumenta mas a oferta não segue na mesma velocidade.
Uberlândia, diferentemente de São Paulo, é uma cidade muito facilitadora à construção. Isso faz com que as médias de preço fiquem muito mais estáveis do que na capital paulista. Em São Paulo existe, por exemplo, uma regra que é a “outorga onerosa” que permite o direito das incorporadoras construírem a mais do que o permitido até determinado limite. Entretanto, para isso, uma contrapartida financeira é pedida. Urbanisticamente é uma ideia até interessante para compensar o investimento e a entrega em projetos de operação urbana como a construção de pontes, preservação da rede viária e de transportes, por exemplo. Entretanto, as restrições acabam trazendo malefícios ainda maiores que os benefícios projetados. Obviamente, este custo foi incorporado no preço dos imóveis, elevando os preços, o que fez várias regiões excluírem as classes mais baixas de seus arredores.
Não é que certas restrições não sejam necessárias, mas elas não ocorrem sem custos. As restrições à oferta de imóveis são um dos temas mais importantes da atualidade. Por um simples motivo: elas afetam a todos. Quanto mais restritivas (mesmo que as leis tenham boas intenções de deixar a cidade organizada) elas são jogadas pela janela e o que importa é o custo porque o preço é afetado. Quando afeta o nosso bolso, afeta todo o resto: qualidade de vida, trabalho, o custo da infraestrutura, a convivência entre classes etc.
Dá pra fazer diferente
Recentemente, em visita à Singapura, fiquei impressionada com o planejamento urbano da cidade-estado. A verticalização é aliada com o verde de uma forma magnífica, favorecendo a densidade na cidade com seus arranha céus. É uma das cidades que mais se pode construir (você chega a ver vários prédios de mais de 70 andares um ao lado do outro), mas ao mesmo tempo é uma cidade verde. Árvores e parques estão por todos os lados, um grande exemplo de metrópole.
Alguns itens interessantes sobre Singapura Planejamento de uso do solo eficiente:
Singapura possui um planejamento rigoroso de uso do solo, garantindo que diferentes áreas sejam alocadas para habitação, comércio, indústria e áreas verdes. Isso ajuda a evitar a expansão desordenada e a congestionamento urbano.
Desenvolvimento sustentável:
a cidade-estado se comprometeu com o desenvolvimento sustentável desde cedo, priorizando a conservação de recursos naturais e a redução do impacto ambiental. Isso inclui investimentos em transporte público eficiente, gerenciamento de resíduos e estratégias de energia limpa.
Habitação acessível e de qualidade:
Singapura implementou programas de habitação público privados bem-sucedidos que garantem que a maioria dos cidadãos tenha acesso à moradias de alta qualidade a preços acessíveis.
Mobilidade urbana eficiente:
a cidade investiu em um sistema de transporte público altamente integrado, que inclui metrôs, ônibus e ciclovias. Isso reduziu a dependência de carros particulares e mitigou problemas de congestionamento.
Zeladoria das áreas verdes:
é conhecida por seus belos espaços verdes, como o Jardim Botânico de Singapura e o Jardim da Baía. A cidade valoriza essas áreas e as utiliza para promover o bem-estar dos cidadãos, melhorando a qualidade de vida urbana.
Tecnologia na gestão urbana:
Singapura adotou tecnologias avançadas para aprimorar a gestão urbana, incluindo sistemas de monitoramento de tráfego, iluminação inteligente e coleta de dados para melhorar a eficiência dos serviços públicos.
Em resumo, Singapura é um exemplo de sucesso no planejamento urbano devido à sua abordagem integrada, foco na sustentabilidade, investimentos em infraestrutura, qualidade de vida para os cidadãos e governança eficaz. Isso a torna uma cidade inspiradora para outros centros urbanos em todo o mundo. Incluindo nossa querida Uberlândia.
Referências:
PIB Brasileiro últimos 10 anos: https://infograficos.gazetadopovo.com. br/economia/pib-do-brasil/
Preço dos Imóveis últimos 12 anos: https://www.infomoney.com.br/ mercados/antes-de-queda-de-juros-preco-de-imoveis-ja-sevaloriza-e-supera-inflacao/
Renda média últimos 10 anos: https://g1.globo.com/economia/ noticia/2023/02/28/renda-media-do-brasileiro-cresce-no-4otrimestre-mas-fica-68percent-abaixo-do-pico.ghtml
Podcast Caos Planejado com Raul da Mota Silva Neto e Fernando Ferreira: https://caosplanejado.com/podcast-55-zoneamento-eacessibilidade-a-moradia/
Amanda Pina Ferreira é economista, internacionalista e CFO da Inconew Construtora
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