As louças e os grandes aparelhos de jantar surgem e enfeitam e valorizam ainda mais os banquetes e as festas.
Álvaro Tadeu Gonçalves de Campos | Fotos Divulgação
Desde as sociedades mais antigas que o ato de comer motiva uma celebração. No Egito antigo, a decifração dos hieróglifos e da arte egípcia possibilitaram ver uma grande movimentação em torno da produção de alimentos, bem como a realização de banquetes, de festas e até de cerimônias fúnebres onde o elemento central era a comida, fonte de energia durante a vida e na vida após a morte. A fertilidade do Rio Nilo permitia aos egípcios ter uma dieta bastante diversificada. Em um determinado papiro, o Anastasi IV, consta uma lista de diversas iguarias que um certo serviçal egípcio deveria preparar para receber o rei Ramsés III. Luis Araújo idealiza a seguinte cena: “Comendo sem talheres, mas lavando previamente as mãos em recipientes apropriados, bebiam por lindas taças de cristal ou mesmo de ouro e utilizavam pratos de travertino (alabastro)”!
Oportunamente, na época do Império Romano, as pessoas cultivavam o hábito de se reunir para comer e beber. Este era um importante ritual no mundo romano. O Triclinium era uma sala de jantar formal na casa romana e a mais importante, que incluía acessórios decorativos de alta qualidade, obras de arte e móveis. O anfitrião se reunia ali para tratar de assuntos mais particulares com um grupo de amigos, familiares, parceiros de negócios e clientes. Mas foi na época dos grandes reinados na Europa que a mesa tornou-se um lugar de grande pompa e circunstância. As regras de etiqueta tomaram força na corte de Luis XIV, o Rei Sol, da França, em meados de 1660. Com a construção do magnífico Palácio de Versailles e a mudança de toda a corte para lá, o rei Luis XIV implementa fortemente um conjunto de regras e de boas maneiras que ele chamará de “etiqueta”.
As louças e os grandes aparelhos de jantar surgem e enfeitam e valorizam ainda mais os banquetes e as festas. A mesa posta começa a ser o cenário de encontros solenes e importantes. No universo de reis, de rainhas e de nobres, especialmente os jantares se tornam um “acontecimento”. Os homens se vestem elegantemente e as mulheres fazem ricos guarda-roupas para se apresentar à altura e dignificar o momento da refeição. É a hora das famílias conversarem entre si e tomarem decisões em torno de uma mesa bonita e convidativa. Esses jantares são glamourosos e toda noite é a mesma coisa: um desfile de boas maneiras e de elegância à mesa.
Trago dois momentos interessantes para ilustrar a comportamento das pessoas em torno da mesa posta no final do século XIX e começo do século XX. No filme Titanic, uma das principais cenas mostra o encontro de pessoas influentes sentadas à mesa do restaurante do navio, ricamente trajadas e desfrutando de um fino jantar. Era 1912, início do século XX. Os homens trajavam “smoking” e as mulheres se apresentavam em vestidos de gala. Na cena, a mesa está lindamente ornada, com louças personalizadas, talheres de prata e taças de cristal.
Em outro filme muito conhecido, é interessante observar a cultura da mesa posta na vida de uma família nobre. Era 1920, a família Crawley habita a mansão Downton Abbey, na Inglaterra. Talvez seja esse o exemplo mais interessante para se observar o hábito da mesa posta no início do século XX na Europa. Todas as noites os serviçais colocam a mesa, impecavelmente, enquanto os patrões vão se preparar para aquele acontecimento diário e solene. Interessante notar, no referido filme, que a cozinha da mansão funciona a todo vapor e envolve dezenas de pessoas para fazer acontecer “o jantar”. Note-se também que são os mordomos e os copeiros que colocam a mesa. As mulheres ficam responsáveis por servir os pratos e pelo apoio durante o jantar. A mesa está forrada com rica toalha, os talheres e as baixelas são de prata, os guardanapos de tecido são bordados com as iniciais da família, as taças de cristal e os castiçais de bronze. A mesa posta valoriza o momento do encontro de familiares e de amigos.
De uns anos para cá, no Brasil e no mundo, as pessoas estão resgatando o hábito da “mesa posta”. Mesa posta não é frescura, é carinho para com a família e também para com os convidados. A mesa posta tem suas regras, que na verdade existem para organizar melhor “o jantar, o almoço ou o chá”. A posição correta dos talheres, a superposição de pratos, o uso do “sousplat”, o lugar certo do guardanapo, os copos de acordo com as bebidas, enfim, tudo existe para tornar o momento da refeição o mais agradável possível.
Atualmente, a mesa posta foi democratizada. Qualquer pessoa, independentemente de classe social, pode montar uma bonita mesa em sua casa. O principal na mesa posta é o carinho e o zelo que se coloca nela. De uns anos para cá, o mercado brasileiro passou a ofertar centenas de itens para este momento. Podemos dizer, inclusive, que virou uma “febre” entre os brasileiros e as brasileiras que curtem esse elegante “hobby”. Literaturas ensinando a montar uma mesa bem arrumada existem aos montes. Ou seja, qualquer pessoa hoje pode ter acesso ao mundo da mesa posta e aprender a dominá-lo. No Brasil, denomina-se “meseiro ou meseira” quem participa desse universo. Mesa Posta é alegria, é beleza, é afeto, é uma forma de arte! Tornou-se também um meio de subsistência para muitas pessoas.
Num dos principais capítulos do Cristianismo, Jesus convida os seus apóstolos para tomarem com ele a última ceia! É um acontecimento importantíssimo na história da humanidade, lindamente retratado por Leonardo Da Vinci. Jesus está sentado no centro de uma grande mesa, na presença das pessoas que ele mais ama. Esta cena tem um aspecto muito simbólico, pois Jesus poderia ter chamado os seus companheiros para um último encontro em qualquer lugar. No entanto, ao mandar o preparar o Cenáculo para aquela ceia, ele nos legou o exemplo de que a mesa é um lugar sagrado e especial para se sentar e comer com quem ama!
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